Reportagem sobre sistema de inspeção automatizado

Originalmente publicada no jornal Hoje em Dia em 15 de Abril de 2014.

Inspeção em carros é feita sem equipamento exigido por norma em BH

A falta de equipamentos obrigatórios para inspeção veicular feita pela BHTrans em ônibus, vans escolares e táxis de Belo Horizonte compromete a qualidade do serviço. As vistorias não seguem especificações do Inmetro, colocando a segurança de passageiros e motoristas em risco.

As falhas já viraram alvo do Ministério Público Estadual (MPE), que investiga a situação. A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) estabelece os critérios nas NBRs 14040-1 e 14040-11. São vistoriados, em média, 106 veículos por dia no local, segundo a BHTrans. Mesmo com inspeção menos rigorosa, a média de reprovação é de 8%.

Carência

A reportagem do Hoje em Dia acompanhou a movimentação no pátio de inspeção veicular da BHTrans, no bairro Buritis, região Oeste, e constatou as falhas na vistoria.

Segundo o inquérito do MPE, as normas da ABNT exigem os aparelhos calibrador de pneus, regloscópio, placa para verificação de alinhamento de rodas, banca de provas de suspensão, frenômetro e equipamento para verificação de folgas. A BHTrans não possuí nenhum deles. Sem os itens, os vistoriadores avaliam os veículos visualmente. Outros testes, como emissão de ruídos e de gases poluentes, não são feitos no local.

Para o engenheiro mecânico Welligton Cesarmar Silva, que avaliou as vistorias na BHTrans e deu o parecer no inquérito do MPE, o procedimento feito pela autarquia não atesta a eficácia da segurança do veículo avaliado. “Abre espaço para a parcialidade. A partir do momento que inspeção é feita sem os equipamentos adequados ela é nula. É impossível testar isso manualmente. Incorre em risco de acidente posterior”, disse.

Para verificação do freio, por exemplo, os técnicos da BHTrans suspendem o veículo e giram a roda manualmente. O próprio motorista do ônibus, escolar ou táxi fica a bordo – o que também é proibido segundo a ABNT, pois dá margem para manipulação do resultado – e aciona o pedal de frenagem. Se funcionar, o item é aprovado.

Segurança

Além disso, os vistoriadores acessam o fosso do pátio sem equipamentos de segurança, como capacete e óculos.

Um dos técnicos da BHTrans admitiu que muitos itens de segurança, como suspensão e folgas, não são devidamente verificados pela falta de equipamentos. “Se eu estiver com dor no ombro, não vou fazer força para girar a roda. Se fôssemos olhar minuciosamente, haveria muitas reprovações e iríamos demorar muito em cada inspeção”, afirmou.

Outro problema é a presença de mecânicos das empresas de ônibus, que fazem pequenos reparos dentro do pátio de inspeção, tornando o local uma espécie de oficina. O correto seria retornar o veículo à garagem para consertar o item e depois retornar à vistoria. l

BHTrans nega que haja precariedade no processo de vistoria

Apesar de ir contra as especificações do Inmetro, a BHTrans nega que haja precariedade nas vistorias e avalia de forma positiva os testes veiculares. O gerente de Controle de Permissões, Reinaldo Avelar Drumond, disse que o objeto das inspeções é garantir a segurança, conforto, equipamentos, higiene, conservação e padronização dos ônibus, escolares e táxis.

Não há nenhum plano para a instalação de equipamentos exigidos pela ABNT no pátio da BHTrans. O gerente disse que o procedimento segue uma série de normas, inclusive do Inmetro e, devido ao grande volume de vistorias realizadas por dia, 106 em média, a forma como é feito o teste é adequada. “Os testes garantem a confiabilidade do serviço. Nosso foco principal é segurança. Somos exigentes e temos profissionais experientes e capacitados”, afirmou.

Ele confirmou que motoristas dos veículos vistoriados participam do processo, mas não influenciam no resultado final. “Eu precisaria de mais um técnico só para pisar em um freio ou ligar uma seta. Nesse caso, não vejo problemas”, disse.

Já quanto aos pequenos reparos feitos no pátio, ele disse que a prioridade é colocar os veículos em operação. “Não justifica o motorista voltar para uma garagem longe, consertar um item simples, para depois fazer um reagendamento. Temos que colocar o coletivo na rua para garantir o serviço”, ressaltou.

Apenas problemas graves são reprovados na oficina. Quando há pequenas falhas que não comprometam a segurança dos passageiros é emitido um parecer de não conformidade temporário e o problema deve ser sanado até a próxima vistoria.

Quanto à falta de equipamentos de segurança para os vistoriadores, como capacete e óculos que entram nos fossos de vistoria, a BHTrans informou que em janeiro a Superintendência Regional do Trabalho fez uma perícia no local e as questões levantadas estão sendo resolvidas. l

Sistema informatizado em empresa credenciada

Enquanto as vistorias dos veículos que servem ao transporte público de Belo Horizonte têm a qualidade comprometida pela falta de equipamentos na BHTrans, os coletivos que atendem à região metropolitana, como os de Contagem, possuem uma inspeção rigorosa.

Em um dos pátios credenciados pelo Inmetro para fazer a avaliação, o sistema informatizado não deixa espaço para a subjetividade dos testes. Os proprietários e motoristas aguardam em uma sala separada e apenas vistoriadores têm acesso ao local de exame. Na Setran, por exemplo, várias câmeras filmam o procedimento, que pode ser acompanhado em tempo real pelo Inmetro.

Os veículos têm os pneus calibrados e faróis aferidos antes da avaliação. A inspeção, que é paga, dura, em média, uma hora. Os equipamentos informatizados emitem laudo técnico.

Irregularidades

Um dos relatórios da auditoria da Ernest e Young sobre os custos dos coletivos de Belo Horizonte, apontou que parte dos ônibus da capital circulam sem requisitos mínimos para a operação, conforme o Hoje em Dia mostrou na edição do último dia 2.

Ao todo, 267 ônibus dos quatro consórcios que operam em BH passaram por uma vistoria realizada pelos consultores em setembro de 2013. O resultado apontou falta de itens obrigatórios por lei, como tacógrafos, extintores de incêndio, informações ao usuário, pneus em desconformidade com legislação, documentação, sensores de portas e até roletas sem homologação pela BHTrans.